Schopenhauer e Magic
Um pouco da filosofia pessimista de Arthur Schopenhauer.
Há 22 horas - 1.519 visualizações - 24 comentários

Saudações, meus caros planinautas. No artigo de hoje, eu gostaria de abordar uma ideia filosófica que, acredito eu, é extremamente latente dentro do nosso contexto. Talvez você nunca tenha ouvido falar dela, mas é certeza que você já experienciou essa sensação. Hoje, veremos um pouco da filosofia pessimista de Arthur Schopenhauer.

 

So, let 's rock!

 

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Arthur Schopenhauer foi um filósofo alemão contemporâneo que ficou conhecido pelo seu forte pessimismo filosófico. Nasceu em Danzig, atual Polônia, dia 22 de fevereiro de 1788. Seu pai era um negociante abastado e sua mãe escritora. Por influência paterna, ele foi criado para ser um negociante, um homem de negócios. Com apenas 5 anos de idade, a família passou a viver na cidade de Hamburgo, na Alemanha. Alguns anos depois foram para a França, local onde Arthur começou a estudar línguas.

 

 

Mas foi em suas viagens que Schopenhauer começou a filosofar sobre a existência humana e os problemas do homem. Ele é mais conhecido pela sua obra principal "O Mundo como Vontade e Representação" (1819), em que ele caracteriza o mundo fenomenal como o produto de uma cega, insaciável e maligna vontade metafísica. A partir do idealismo transcendental de Immanuel Kant, Schopenhauer desenvolveu um sistema metafísico ateu e ético que tem sido descrito como uma manifestação exemplar de pessimismo filosófico. Schopenhauer foi o filósofo que introduziu o pensamento indiano e alguns dos conceitos budistas na metafísica alemã.


Misantropo, pessimista, solitário, individualista e crítico ferrenho da sociedade, Schopenhauer considerava o amor apenas como vontade cega e irracional que todos os seres têm de se reproduzir, dando assim continuidade à vida e, por conseguinte, ao sofrimento. Para ele, o mundo era regido pela Vontade e, embora fosse ateu, ele representava a Vontade como uma espécie de Deus da raça humana, uma vez que, esta era inerente aos seres humanos, sem exceção, tornando assim a vida cheia de sofrimento. Partindo desse ponto, a Vontade era a raiz de todo o sofrimento humano, pois aflorava o desejo e, como cada indivíduo é incapaz de simplesmente viver com o que se tem, o amplo desejo de sempre querer mais torna-nos escravos da Vontade. Resultando em um círculo vicioso de sofrimento.


Por influência das filosofias budistas e orientais, Schopenhauer procura uma forma de libertação deste círculo de dor e sofrimento; busca na renúncia pelos desejos o escape do sofrimento, alcançando assim, o Nirvana. Vale ressaltar que Schopenhauer também identificava no cristianismo genuíno, este mesmo mecanismo de libertação.


Embora em vida, seus escritos não tenham lhe rendido bons frutos financeiros, sua vida fora sustentada pela herança de seu pai, somente em seus últimos anos de vida é que seus escritos alcançaram notoriedade, uma vez que o filósofo alemão Hegel entrou em declínio, Schopenhauer tornou-se o novo ídolo da nova geração. Faleceu aos 72 anos de idade, em 21 de setembro de 1860, sendo chamado de “cavaleiro solitário”, por Friedrich Nietzsche.

 

Mas o que diabos isso tudo tem a ver com Magic?


Para ilustrar melhor a temática que pretendo abordar aqui, deixo para você um trecho do filme “Os Sem Floresta.

 

https://getyarn.io/yarn-clip/af90c3a3-afca-4a30-aa48-00fe2fcf9fba

 

Nesta cena, o guaxinim RJ assalta a toca de Vicent, porém é pego em flagrante. Toda a comida do urso é perdida e RJ promete que recuperaria tudo. Na frase do vídeo, Vincent faz questão que ele lhe traga um pacote de Spuddie - um tipo de chips -, afinal “enough just isn’t enough.”


Na visão de Schopenhauer, não existia o conceito de suficiente, pois a Vontade (o Deus que regia o indivíduo), sempre o impelia a buscar mais. Dessa reflexão filosófica, nasceu a célebre frase, “a vida é uma constante oscilação entre a ânsia de ter e o tédio de possuir.


E eu não conheço nenhum indivíduo que experimente isso de forma tão latente quanto o jogador de Commander!


A vida de um jogador de Commander o leva ao pêndulo de Schopenhauer; segundo o filósofo, vivemos nesse pêndulo constante onde, de um lado temos o sofrimento pela busca do que não temos, enquanto que do outro lado, experienciamos o tédio pela conquista. 


Quantas vezes você se empolgou para montar aquele deck novo ou comprar aquele novo precon, ficou eufórico pela chegada dele, correu atrás de cartas que lhe faltavam, comprou, trocou e conseguiu deixar o deck redondinho. Relembre este período, relembre a empolgação e toda a energia que você tinha em busca do “esse agora será o meu melhor deck” e como você estava empolgado em jogar com ele a cada partida e em cada derrota, pensando nas melhores formas de aprimorá-lo.


Lembrou-se?


Ótimo, agora lembre-se do que se seguiu após finalmente alcançar a Magnum Opus do deckbuilding. Quais os sentimentos que sobrevieram quando finalmente, seu Kraum ficou pronto? Consegue se lembrar da última vez que se empolgou em jogar com aquele deck novamente?


Pois é, meus caros, em nosso vício e paixão pelo Commander, vivemos um constante fluxo de mania e depressão. Para os que não estão familiarizados com o termo, mania é um sintoma do transtorno bipolar caracterizado pela  sensação excessiva de euforia. Infelizmente para nós, o que se segue logo após a conquista, é o tédio. As partidas com aquele deck não são mais atrativas, o deck que você achava que seria sua última obra prima, com o tempo, tornou-se apenas mais um deck em sua prateleira. 

 

 

“Ah, mas eu não tenho tantos decks assim.”


Se você não é um acumulador de Magic, então você deve ser um reciclador, o tipo de indivíduo que sempre que chega a um número X de decks, troca ou passa um para frente, porém, logo em seguida, parte em busca de outro deck. A questão aqui não é quantidade, e sim o impulso que nos rege para continuarmos nessa busca. Não é à toa que Commander é o formato mais popular, pois tudo o que o envolve está atrelado a essas características marcantes da natureza humana.


Sofremos por não termos aquela staple; sofremos porque não conseguimos comprar aquele precon no lançamento e nessa idas e vindas do pêndulo, somos acarretados pelo tédio. O que mais me fascina é que, o tédio não é empecilho para deixarmos o sofrimento de lado, pelo contrário, é uma ferramenta alimentadora do desejo, pois somente enquanto buscamos o desejo é que nos sentimos vivos de fato. O ímpeto e a gana que nos motivam, alimenta a Grande Fornalha dentro de nós.


Por mais que a filosofia de Schopenhauer seja voltada para o pessimismo, visto que, no final estaremos sempre sofrendo, seja pelo tédio ou pela dor de não termos algo, pode-se alcançar equilíbrio e alegria nesses intervalos do pêndulo. Não acredito em uma vida totalmente voltada para a tristeza e completo niilismo, encontramos felicidade e alegria até nas pequenas coisas e vitórias do dia a dia. A busca pelo o que te falta pode ser sofrimento ou prazerosa, afinal quem dá sentido a tudo isso é você; da mesma forma, você, caro jogador de Commander, não precisa se desesperar. A alegria do jogo envolve mais do que simplesmente ganhar uma partida, mas o próprio deckbuilding, a quest pelas queridas cartas e as amizades e risadas que se acumulam ao longo da vida, são mais do que o suficiente para fornecer o equilíbrio que necessitamos entre o tédio e o sofrimento.


Até a próxima, planinautas.

Leandro Dantes ( Arconte)
Leandro conheceu o Magic em 1998 e, desde então, se apaixonou pelo Lore do jogo. Após retornar a jogar em 2008, se interessou por lendas, o que resultou por despertar a paixão pela escrita. Sempre foi mais colecionador do que jogador e sua graduação em Pedagogia pela Ufscar cooperou para que ele aprimorasse e desenvolvesse um estilo próprio. Autor de alguns contos, todos relacionados ao Magic, já traduziu o livro de Invasão e criou sua própria saga com seu personagem, conhecido como Arconte.
Redes Sociais: Facebook
Comentários
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- 22/02/2025 08:18:09
Na minha visao, o q percebo eh q na verdade pessoas "insatisfeitas" e frustradas no commander sao reflexo do sao. Pra mim, nao ha nada mais prazeroso, no mundo do MTG, do q criar um deck e aprimora-lo ate o ponto do ideal. Eh realmente satisfatorio e nao enjoo dos decks q tenho, ate pq com a porrada de lançamentos q a wizards proporciona sempre tem algo novo a se explorar e acrescentar ao deck kkkkkkkkkkkkkkkk
(Quote)
- 22/02/2025 08:14:08

Rapaz, te dou os parabens. Nao eh qualquer um q sabe isso e descreve de forma precisa. Esses filosofos q fogem a metafisica em geral so propagam o q nao "presta".

(Quote)
- 21/02/2025 23:40:57
Muito massa o artigo.
Vontade é a lei!
(Quote)
- 21/02/2025 23:14:51
Me senti acolhido.
(Quote)
- 21/02/2025 21:22:48

Então, mas ele não é nem um pouco metafísico, ele é fenomenológico. Justamente, ele é o primeiro a trazer influência da filosofia oriental, tanto que a base da filosofia dele não reside em elementos inalcansáveis pelo homem, e sim, em sua angústia. Tanto que a Vontade é um vetor humano, não algo divino, metafísico. Eu não gosto de autores que tentam "inventar" uma metafísica onde não há, é como se quisessem relativizar onde não há onde relativizar. Conhecendo a persona do Schopenhauer, em sua biografia, acho que ele ia rasgar uns "cús" de uma galera por aí kkkkk
- Sim, literalmente, o Schopenhauer era o precursor do Dr. House, rsrs

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