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Magic é investimento ou é um gasto supérfluo que simplesmente serve para alimentar um hobby?
Bom, independentemente do que você pense sobre isso hoje, tenho certeza que já se pegou pensando sobre isso em algum momento da sua vida de jogador ou colecionador dessas cartinhas do demônio, que ficam guardadas em pastas e caixas de sapato no seu quarto ou escritório. E é exatamente sobre isso que vai ser o artigo do mês.
Eu sei que devo escrever sobre Legacy, mas Legacy ultimamente está tão chatinho e estou jogando tão pouco (zero nesse mês), que achei melhor abordar um tema bem pouco abordado, pelo menos em português.
Antes de mais nada, é preciso definir o que é um investimento e o que é um gasto, e a partir daí a gente procura enquadrar o Magic em um deles.
De um modo superficial, em economia, investimento é o ato de acumulação de capital, sendo que capital, por sua vez, é tudo aquilo que possa funcionar como meio de produção de outros bens, em outras palavras, gerar mais riqueza (máquinas, por exemplo). Entretanto, não sou economista e nem acho que esse seja o ponto, por isso nós temos que simplificar esse conceito.
Corriqueiramente, investimento é toda aplicação financeira que possa gerar um retorno financeiro sobre o capital aplicado (aqui lido como dinheiro), no futuro. A grosso modo, se coloco 100 reais na poupança hoje, daqui um ano quero tirar 100 reais de lá, mais 1,4%, que é o que rende a poupança atualmente. Logo, fiz um investimento incrível que me rendeu espetaculares R$ 1,40.
Na contabilidade, embora eu também não seja um contador, sei que, no que pese serem bem parecidos, gastos, custos e despesas são coisas diferentes, entretanto, de novo, o que queremos aqui é o conceito de padaria. Isso mesmo, aquele que você escreve num papel de pão e até sua avó de 95 anos entende.
Gasto, então, é toda saída de capital (leia-se dinheiro), necessária para o financiamento de sua vida, sem que possa gerar um retorno financeiro no futuro. Assim, se eu desço aqui do prédio onde eu moro e vou até o restaurante da Dona Cida para comprar uma marmita, isso é um gasto. Por mais que eu quisesse gastar R$ 10,00nessa marmita e no dia seguinte surgisse de dentro do marmitex R$ 11,00, isso não vai acontecer. Eu simplesmente não vou ver esses R$ 10,00 nunca mais.
O que é bem importante lembrar aqui, é que temos que nos restringir ao retorno financeiro. Por exemplo, eu não posso considerar gastar com comida um investimento, porque comida vai me deixar saudável e feliz (sim, eu fico bem feliz quando como); nem posso considerar que comprar filé mignon ao invés de chã de dentro é um investimento no meu paladar. Não! O retorno que a gente precisa auferir, aqui, é financeiro.
Considerando esses dois conceitos, vamos direto às cartinhas de Magic, salpicada pela experiencia que tive com algumas cartinhas da minha antiga coleção, ou seja, reserved list vem aí!
Eu sei que quando a gente compra uma carta de Magic, principalmente quando somos novatos no game, a última coisa que passa pela nossa cabeça é qual valor aquela carta vai ter no futuro. Se eu compro um Griselbrand, por exemplo, a única coisa que eu penso é como vai ser bom colocar ele em jogo no turno 0 e moer as esperanças do meu oponente, causando choro e rangir de dentes durante o processo.
O que acontece, geralmente, é você comprar esse Griselbrand, colocar no seu deck, usá-lo por meses ou até anos, e depois desse período vendê-lo, seja porque se cansou de destruir as esperanças de seus oponentes, ou seja porque resolveu fazer alguns amigos, após todos esses anos. Aí, nesse momento, você pode ter uma surpresa: o Griselbrand está valendo o dobro do que você pagou por ele.
De fato, ressalto que se você tivesse comprado o Grisel em 2012, no lançamento, teria gastado uns R$ 20,00, mas se tivesse vendido em 2014, teria conseguido pelo menos uns R$ 50,00 nele. Tudo bem que hoje, no caso do capetão aí em cima, ele está valendo próximo do preço do lançamento, se desconsiderarmos o dólar valorizado, mas o exemplo foi tão legal e eu já tinha escrito dois parágrafos dele quando percebi, que resolvi manter (my bad).
Mas peguemos o exemplo de Força de Vontade. Eu sei que ela foi lançada em 1996, mas eu só comecei a jogar competitivamente no final de 2012. Em 2010, que é até quando temos registro de preço da carta no MTG Goldfish, seu preço era 50,00 USD e hoje ela custa nada menos que 100,00 USD, apesar de todos os reprints que sofreu.
Eu mesmo comprei a minha em 2012 por R$ 100,00 cada, vendi por R$ 250,00 em 2014 e comprei um set de alteradas no exterior por 400,00 USD. Recentemente vendi o set das alteradas por 550,00 USD, para um camarada das Filipinas. Além da FoW, eu posso citar mais alguns exemplos, como Confidente Sombrio, que começou valendo 20,00 USD, hoje vale 40, mas já atingiu 80. Ou Tarmogoyf, Comando Críptico, Wren e Seis (que valorizou 4 ou 5 vezes seu preço de pré-venda até ser banido), todas as fetches até os reprints e dos reprints até agora, Raio borda preta de 4th edição, Espadas em Arados de FNM, basicamente todas as foil de edição das atuais Staples de Modern e Legacy, e a lista é extensa.
Os exemplos são muitos, mas tem uma categoria de cartas do Magic que são a nata das valorizações, o crème de la crème do MTG: a Reserved List, principalmente se consideradas as edições de Alpha e Beta.
Por incrível que possa parecer, esse não é um artigo para falar mal da Reserved List, afinal estamos falando de valorizações e do aspecto financeiro do MTG e as cartas da Reserved, com certeza absoluta, são as que apresentaram ao longo de todos esses 27 anos de jogo, as valorizações mais consistentes do jogo.
Infelizmente, como eu disse, minha experiencia com o jogo não vai tão longe e minha memória de preços está limitada ao MTGGoldfish, mas eu sei, através de outros jogadores, que cartas da Reserved, principalmente terrenos como Old Duals e Berço de Geia, já puderam ser trocadas por um Big Mac (experiência real de um amigo meu). Atualmente, porém, é mais fácil trocá-las por um carro popular seminovo, e acredite, eu tenho outro amigo que vendeu o próprio carro para comprar Old Dual (será qual dos dois fez uma melhor troca?)
Na minha experiencia, eu comprei Underground Sea em 2013, em uma loja de BH, por meros R$ 300,00. Atualmente vendi essa mesma Underground Sea por R$ 1.800,00, ou seja, um retorno sobre o investimento inicial de 6 vezes o valor que paguei, em 7 anos e meio. Se a gente considerar a valorização do índice Ibovespa, médio, de janeiro de 2013 a 2020, que foi de 8% (aproximadamente) ao ano, no final de 2020, caso eu tivesse colocado esses mesmos R$ 300,00 investidos num ETF do índice (que é basicamente um fundo que replica o índice), eu teria resgatado hoje apenas R$ 512,00.
Detalhe importante, o investimento em bolsa tem um risco acentuado se comparado ao Magic, principalmente para cartas da Reserved que não correm o risco de serem reprintadas. Se eu comparasse com a poupança, que é um investimento com risco muito baixo, e rendia razoavelmente bem, até pouco tempo atrás, eu teria hoje, em 2020, R$ 469,67, caso tivesse deixado os mesmos R$ 300,00 lá, paradinhos, desde janeiro de 2013. Ou seja, um rendimento médio anual aproximado de 6%. Isso porque nem estamos considerando a inflação, que na média, nos últimos 8 anos foi de 5,77% ao ano, conforme IPCA.
Talvez você já tenha ciência disso, talvez não, mas nosso lindo país subdesenvolvido tem uma taxa considerável de inflação anual, ainda, e o rendimento anual real que eu teria tido, se tivesse largado meu rico dinheirinho na poupança, seria de meros 0,13%. Valorização real, quer dizer manutenção do poder de compra, que é exatamente aquilo que a inflação corrói.
Em outras palavras o que você comprava com R$ 100,00 em 2000, hoje em dia você não compra mais. Na verdade, você precisaria de R$ 335,32 hoje, para comprar a mesma coisa que comprava em 2000, se corrigirmos o valor pelo IPCA, que é um dos índices que mede a inflação.
Considerando a valorização da minha Underground Sea, exibida 2 parágrafos acima, a gente pode verificar facilmente que ela foi de 600% em 7 anos e meio, ou
aproximadamente lindíssimos 28% ao ano, considerando os juros compostos, é claro. A título comparativo, uma curiosidade: Warren Buffet, um dos maiores investidores de todos os tempos, conseguiu, na média, 20,5% de rentabilidade ao ano durante toda sua vida de investidor, até agora. Ou seja, eu bati o Warren Buffet com minha Underground Sea.
Em bom e velho português: saporra de cartinha valoriza pra caraca e ainda protege da inflação!
Mas Thiago, eu não compro Reserved List, muito menos cartas Legacy, eu mal tenho dinheiro para comprar um lixão de Theros, na loja da esquina!
Bom, é claro que a valorização da reserved não pode ser comparada à valorização das outras cartas de magic, de um modo geral. As cartas da Reserved seriam as Blue Chips do Magic. No entanto, a gente tem que entender um outro conceito que pode e deve ser aplicado ao Magic, que é o conceito de escassez.
Escassez, na economia, e agora é importante, significa que não há uma quantidade suficiente de um produto para distribui-lo a preço 0 para atender todas as pessoas que precisam desse produto ou demandam por ele no mundo. Cartas de Magic, como um todo, é um produto finito, mesmo se a gente falar daquele Choque, reprintado como comum 2000 vezes pela Wizards.
Tenho certeza que não conseguiríamos prover com um set de Choque cada jogador de Magic do mundo, se seu custo fosse 0. Por isso, para regular essa distribuição existe o sistema de preços, que basicamente serve como um termômetro para regular oferta e demanda, afinal, somente aqueles dispostos a pagar o preço do bem, terão esse bem em sua propriedade, considerando aí o tamanho do estoque desse bem no mundo e procura por ele. De maneira simples, quanto maior a demanda e menor a oferta, mais alto o preço e vice-e-versa.
É por isso que uma Underground Sea, hoje, custa R$ 1.800,00 e uma ilha de Theros custa R$ 0,10. No entanto, raciocina comigo. Imagine que você, que mal compra lixão na loja da esquina tenha comprado, em julho de 2013 um lixão de Cold Snap e no meio dele tenha vindo 10 Bijuteria de Mishra. Esse seu lixão ficou lá, jogado no canto da sua sala até meados de 2017, quando surgiu um deck de Modern usando 4 delas no main deck, rapelando todos os outros decks do formato. De repente, a demanda por essa carta incomum de Cold Snap, que em 2013 não valia nada, explodiu e o preço foi de menos de R$ 1,00 para R$ 150,00, porque a tiragem foi baixa e ninguém comprou Cold Snap aos montes. Simplesmente uma valorização de 150 vezes em 4 anos, ou 15.000%, que deixou
no chinelo minha Underground Sea e chamou Warren Buffet de juninho.
Guardadas as devidas proporções, é como no mercado de capitais, com muito menos liquidez, obvio. A oferta e a demanda determinam o preço de cada ação, levando em consideração, inclusive, o número de ações disponíveis a venda, de cada empresa. Se muita gente procura por uma ação, o preço dela tende a subir. Se existem poucas ações no free float da companhia (que é basicamente o número de ações negociadas no mercado), essa ação tende a subir mais ainda, justamente porque é mais escassa. E da mesma forma que ações, de uma maneira simplória, o melhor jeito de aproveitar sua valorização é no longo prazo e acumulando mais e mais sempre, só assim você vai ter a chance de aproveitar valorizações absurdas, como a da Bijuteria de Mishra, acima.
Bom, como se não bastasse tudo isso que já foi dito, ainda tem um bônus, sabia? Os preços das cartas geralmente estão atrelados ao dólar. Claro que não acompanha 100%, mas se o dólar sobe o preço da carta de Magic sobe junto. Sabe o que é isso? Em finanças se chama hedge, que é basicamente uma proteção.
Como eu disse lá em cima, a gente vive num país subdesenvolvido, extremamente bagunçado, com pouca segurança jurídica e baixíssima estabilidade política, fiscal e econômica. Isso resulta em uma moeda estupidamente fraca. Para vocês terem uma ideia básica do que estou falando, nossa moeda foi a mais atingida por desvalorização nessa crise atual, cerca de 28%. O penúltimo lugar, logo na nossa frente, desvalorizou metade, aproximadamente 14% e foi a Lira Turca. Isso mesmo, a Lira Turca, tenho certeza que você nem sabia da existência dessa moeda. Resultado, o dólar tá custando R$ 5,50 e ir pra Disney é uma realidade que existiu até 2014 e olhe lá.
Dúvida? Experimenta dolarizar todo seu patrimônio. Melhor, dolariza seu rendimento anual total. Pronto? Agora considere que o salário mínimo anual nos EUA é 15.000 USD, e trabalhadores de redes de fast food e chão de fábrica de grandes companhias, ganham em média 30.000USD por ano, o que equivalem a R$ 150.000,00.
Você acha que não te afeta? Já experimentou comprar computadores, celulares, impressoras hoje em dia? Não? E pão, você compra? Gasolina? Quando achar que isso não te afeta, é só pensar que “trigo é dólar e pão é trigo, logo pão é dólar!”
Isso quer dizer que nosso dinheiro não vale nada lá fora e vale menos aqui dentro, considerando os preços de comodities importadas e manufaturados (já viu o preço de um notebook novo?). Não compra nada em dólar e o brasileiro ficou mais pobre em relação ao mundo.
Logo, é sempre bom que você invista num país desenvolvido, preferencialmente em dólar, para proteger o próprio patrimônio, daí é o que se chama de fazer hedge, ou hedgear seu investimento. Afinal você está investindo em uma moeda forte e se o real desvalorizar absurdamente igual está acontecendo, seu suado dinheirinho vai estar lá, bonitão, em dólar.
Comparativamente, muita gente gosta de falar que empresas exportadoras, no Brasil, tem hedge natural, porque vendem em dólar. Logo, se o custo de produção aumentar, por causa de matéria prima importada ou dívida em dólar, isso vai ser compensado pela venda de seu produto em dólar.
Você, jogador de MTG do interior de Minas Gerais, como eu, que morei em Bom Sucesso, com 5 mil habitantes, desde que comprou sua primeira cartinha de Magic, inconscientemente, já estava hedgeando seu patrimônio, já que quando for vender suas cartas, o preço dela vai ter acompanhado o dólar, do mesmo jeito que grandes empresas exportadoras fazem com seus produtos (elas também compram dólar futuro, mas isso não é assunto pra agora). Tá vendo? Duvido que você já havia pensado nisso, que quando comprou aquele booster de Modern Masters pela primeira vez, na verdade estava hedgeando seu patrimônio.
Sabe o que isso significa? Que agora, quando for comprar uma carta de Magic você tem a justificativa perfeita pra dar pra esposa:
“Com licença meu bem, mas eu sei muito bem o que estou fazendo, eu estou hedgeando nosso patrimônio, em dólar, e isso vai ser de excelente valia para nossas finanças em alguns anos.”
Gostou? Espero que use essa justificativa na próxima vez.
Considerando todo artigo, os conceitos de investimentos e gastos, sinceramente me diga, você ainda acha que Magic é um gasto?
Dê sua opinião abaixo e bora discutir mais nos comentários! E não se esqueça, inscreva- se no meu canal do Youtube e curtas os vídeos postados lá...ou não...sei lá hahaha!
Disclaimer: Não estou querendo com esse artigo que você venda sua casa, seu carro e compre tudo de MTG, porque as cartas valerão uma fortuna no futuro. MTG é um mercado de nicho e como todo mercado de nicho tem seus riscos e é preciso um bom entendimento desse mercado para ganhar dinheiro com ele, de forma que qualquer valorização futura, apesar de esperada, não é garantida. Então lembre-se, esse é um texto argumentativo e não é recomendação de investimento ou de compra.
-Valor é diferente de R$. Se voce usa uma carta no teu deck, tem mais valor que ela na pasta. Isso é fato.
-Se você comprou um set de cartas à R$ 2X e depois que rotacionou ou foi banida, vendeu à R$ X , você nao perdeu dinheiro, voce perdeu o tempo de vender. É assim que investimento funciona, a perda de R$ foi em decorrência da sua má decisão de venda.
-Se quer ganhar dinheiro com Magic, tem que investir MUITO. Uma carta ou outra não te faz o acionista de Magic.
Se a carta tem algum proveito pra você (deck, venda futura, etc), é investimento. Se você comprou por comprar, é gasto (ainda que possa ganhar com isso, nesse caso especifico é loteria).